sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
Arroz e familia
Familia é um prato dificil de preparar. Com esta frase o escritor, romancista estreante, Francisco Azevedo costura seu romance: O Arroz de Palma. A trama é de uma simplicidade capaz de tornar cada leitor um coadjuvante do romance. Mas essa simplicidade é ao mesmo tempo tingida de tal delicadeza que nos deixa comovidos desde que tomamos o livro nas mãos, até terminá-lo com pesar, querendo mais um pouquinho. Quem, independente da idade e da circunstância singular, ainda não se questionou sobre a propria família, o lugar de cada um, os mitos que constroem cada romance familiar? Não sei o que os críticos literários têm dito sobre este livro, tão simples e tão palatável, diante das circunvoluções e ou das asperezas da literatura contemporânea. É um romance fora do tempo, ou, como diz o narrador, um tempo qualquer- mistério da terreníssima trindade- passado, presente e futuro, tres pessoas distintas, reunidas numa só.
lixo extra-ordinário
O que fazer com os restos? Tanto no sentido social como no sentido pessoal, eles podem ter caminhos diversos: viram entulho e ficam ali, sufocando a vida da gente, entupindo as cidades. Viram lixo que tenta-se jogar fora, para se ver livre. Mas acaba que o mal-cheiro persiste, pedindo uma solução. Os lixões das cidades mostram o resultado desta mera transferência do que é indesejável de um lugar pra outro: o problema continua a clamar por um encaminhamento, continua causando problemas.
Mas os restos podem ser reciclados, resignificados e virarem outra coisa. Podem ser transformados em matéria prima nas reciclagens e podem até tornarem-se obras de arte.
Um exemplo incrível disso é o documentário Lixo Extraordinário, dirigido pelo brasileiro João Jardim e a inglesa Karen Harley. O filme é candidato ao Oscar de melhor documentário do ano. Tem-se a emoção de assistir, mais que isso, de ser tomado pela beleza da sensibilidade do artista de transformar o lixo em obra de arte. O documentário acompanha o trabalho do mundialmente reconhecido artista brasileiro Vik Muniz que decide retornar ao estado do Rio de Janeiro, sua cidade natal e contribuir para transformar a vida das pessoas envolvidas com o lixão de Gramacho, localizado em Duque de Caxias e considerado o maior aterro sanitário do mundo.
Num trabalho de pesquisa-ação, Vik Muniz envolve-se com as pessoas que vivem no e do lixo e junto com elas constrói obras de arte, a partir da vida delas e tendo o lixo como matéria prima. Esta interação permite que essas pessoas saiam do lugar passivo de vítimas da pobreza e do lixo, para o papel de protagonistas de uma obra de arte e que resulta numa transformação na vida delas. Vik Muniz, num trabalho de construção, transforma junto com elas aquilo que era ordinário, no sentido pejorativo da palavra, em algo extra, que vai além, muito além.
Parece um pouco com o trabalho analítico, que também visa dar um giro e permitir que o analisante possa transformar, reposicionar-se diante daquilo que constitui o seu fantasma, a pedra do seu sapato, em outra coisa. O ato criador e o ato analítico tem este traço em comum, como diria Lacan, fazem do lixo, um luxo
Tomara que o mundo hollywoodiano reconheça este trabalho. Mas, se não reconhecer, algo já foi colocado em movimento. Não há mais volta. Também é assim o trabalho na psicanálise
Mas os restos podem ser reciclados, resignificados e virarem outra coisa. Podem ser transformados em matéria prima nas reciclagens e podem até tornarem-se obras de arte.
Um exemplo incrível disso é o documentário Lixo Extraordinário, dirigido pelo brasileiro João Jardim e a inglesa Karen Harley. O filme é candidato ao Oscar de melhor documentário do ano. Tem-se a emoção de assistir, mais que isso, de ser tomado pela beleza da sensibilidade do artista de transformar o lixo em obra de arte. O documentário acompanha o trabalho do mundialmente reconhecido artista brasileiro Vik Muniz que decide retornar ao estado do Rio de Janeiro, sua cidade natal e contribuir para transformar a vida das pessoas envolvidas com o lixão de Gramacho, localizado em Duque de Caxias e considerado o maior aterro sanitário do mundo.
Num trabalho de pesquisa-ação, Vik Muniz envolve-se com as pessoas que vivem no e do lixo e junto com elas constrói obras de arte, a partir da vida delas e tendo o lixo como matéria prima. Esta interação permite que essas pessoas saiam do lugar passivo de vítimas da pobreza e do lixo, para o papel de protagonistas de uma obra de arte e que resulta numa transformação na vida delas. Vik Muniz, num trabalho de construção, transforma junto com elas aquilo que era ordinário, no sentido pejorativo da palavra, em algo extra, que vai além, muito além.
Parece um pouco com o trabalho analítico, que também visa dar um giro e permitir que o analisante possa transformar, reposicionar-se diante daquilo que constitui o seu fantasma, a pedra do seu sapato, em outra coisa. O ato criador e o ato analítico tem este traço em comum, como diria Lacan, fazem do lixo, um luxo
Tomara que o mundo hollywoodiano reconheça este trabalho. Mas, se não reconhecer, algo já foi colocado em movimento. Não há mais volta. Também é assim o trabalho na psicanálise
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
terça-feira, 26 de outubro de 2010
terça feira: dia de ficar
Terça feira é dia de ficar. É, assim como os adolescentes. Ficar com a escrita. Sem compromisso, flertar com ela e ver no que vai dar. Vai dar namoro? Sei lá! Casamento? Provavelmente, não. Mas gosto desse sopro doce que me visita e me faz querer estar lá onde o mais além da palavra habita.
Um dia a palavra me encantou, pra me tornar humana. Mais tarde, torna a me chamar, pra me fazer mulher. Mas e o chamado de escritora? Desses radicais que viram uma danação? Daqueles que querem a palavra viva, sem metáforas, falando por si mesma? Confesso que ainda não ouvi esse canto de sereia, que parece jogar os escritores no mar da não linguagem.
Por enquanto fico por aqui, no risco tímido, passo miúdo, como nos primeiros beijos, desajeitados, dos adolescentes.
Um dia a palavra me encantou, pra me tornar humana. Mais tarde, torna a me chamar, pra me fazer mulher. Mas e o chamado de escritora? Desses radicais que viram uma danação? Daqueles que querem a palavra viva, sem metáforas, falando por si mesma? Confesso que ainda não ouvi esse canto de sereia, que parece jogar os escritores no mar da não linguagem.
Por enquanto fico por aqui, no risco tímido, passo miúdo, como nos primeiros beijos, desajeitados, dos adolescentes.
quarta-feira, 6 de outubro de 2010
recado para o Drummond
Minha cidade, como todos os amores, é cheia de sim e de não. Em suas esquinas está guardada a minha história, também cheia de sim e de não, prazeres e dores. Impossível separar uma face da outra: quantas lembranças, quantos esquecimentos. Minha cidade se faz com sonhos de uma vida melhor, mas também se faz com perdas. Foi concebida para caber dentro de um contorno, mas rompeu os seus limites e deu lugar a inusitados acontecimentos.
Seus poetas vieram para bendizer e maldizer as suas delicias e mazelas. Frei Beto, escondido em sua memória, ainda brinca na cidade de sua infância. Drummond, em 1976, chegou até a afirmar que não voltaria mais a Belo Horizonte. Seu ar ingênuo de cidade púbere tinha se transformado e ela tinha virado uma cidade atroz. Violada em suas entranhas para dar lugar a arranha-céus, era escrava da mais valia, perdera sua graça de cidade menina em nome do capital.
Mas assim mesmo, deixo um recado para o Drummond: ainda resta um belo horizonte e belas paisagens, um por do sol magnífico e ipês e paineiras florindo nas avenidas. Em suas ruas ainda perambulam meninas bonitas e a Serra do Curral ainda tem uma casquinha linda que dá um contorno magnífico à megalópole.
Com a violência urbana, Belo horizonte não tem mais a frescura do pêssego, mas tem a cor dos festivais, tem bares alegres onde seus jovens talvez ainda queiram sonhar com um mundo mais justo.
Como você, Drummond, vivi em outra Belo Horizonte. Lá naquele tempo em que estudar em grupo escolar era um aconchego! Que o colégio Estadual era célebre por preparar bem seus alunos. (E não é que meus professores eram autores dos livros em que estudávamos?)
Tempo em que as horas dançantes aconteciam em uma varanda qualquer, quando se dançava até acabar a pilha da vitrolinha portátil. Na hora de dançar, sentir o coração apertado, enquanto me encostava no peito dos rapazes. Era um tempo de sair para namorar nas tardes de domingo, ir à sessão de cinema pra depois tomar lanche no Xodó e perambular na praça da Liberdade, em meio às conquistas e medos das novidades da adolescência.
Ah, eu amava tanto aquela praça que até sonhava que um dia ela poderia ser minha! Morar por ali, olhar pela janela e ver aquela paisagem: as palmeiras imperiais, o romântico coreto e a magia da fonte luminosa jorrando fagulhas no meio da noite. A praça, Drummond, continua linda. Talvez para nos mostrar que nem tudo está perdido, que há uma beleza que atravessa o tempo. A nossa cidade, como todos os amores, é habitada por sins e por nãos. E se você, Drummond, olhasse com carinho, com ares de perdão, talvez pudesse encontrar algo que lembrasse a sua cidade menina-ingênua da qual tinha tanta saudade e tanto medo de rever maculada. Ela não é mais menina, nem ingênua, eu também não. Mas talvez nela ainda viva, como acontece comigo, algo que não envelhece jamais.
– out/2010
Seus poetas vieram para bendizer e maldizer as suas delicias e mazelas. Frei Beto, escondido em sua memória, ainda brinca na cidade de sua infância. Drummond, em 1976, chegou até a afirmar que não voltaria mais a Belo Horizonte. Seu ar ingênuo de cidade púbere tinha se transformado e ela tinha virado uma cidade atroz. Violada em suas entranhas para dar lugar a arranha-céus, era escrava da mais valia, perdera sua graça de cidade menina em nome do capital.
Mas assim mesmo, deixo um recado para o Drummond: ainda resta um belo horizonte e belas paisagens, um por do sol magnífico e ipês e paineiras florindo nas avenidas. Em suas ruas ainda perambulam meninas bonitas e a Serra do Curral ainda tem uma casquinha linda que dá um contorno magnífico à megalópole.
Com a violência urbana, Belo horizonte não tem mais a frescura do pêssego, mas tem a cor dos festivais, tem bares alegres onde seus jovens talvez ainda queiram sonhar com um mundo mais justo.
Como você, Drummond, vivi em outra Belo Horizonte. Lá naquele tempo em que estudar em grupo escolar era um aconchego! Que o colégio Estadual era célebre por preparar bem seus alunos. (E não é que meus professores eram autores dos livros em que estudávamos?)
Tempo em que as horas dançantes aconteciam em uma varanda qualquer, quando se dançava até acabar a pilha da vitrolinha portátil. Na hora de dançar, sentir o coração apertado, enquanto me encostava no peito dos rapazes. Era um tempo de sair para namorar nas tardes de domingo, ir à sessão de cinema pra depois tomar lanche no Xodó e perambular na praça da Liberdade, em meio às conquistas e medos das novidades da adolescência.
Ah, eu amava tanto aquela praça que até sonhava que um dia ela poderia ser minha! Morar por ali, olhar pela janela e ver aquela paisagem: as palmeiras imperiais, o romântico coreto e a magia da fonte luminosa jorrando fagulhas no meio da noite. A praça, Drummond, continua linda. Talvez para nos mostrar que nem tudo está perdido, que há uma beleza que atravessa o tempo. A nossa cidade, como todos os amores, é habitada por sins e por nãos. E se você, Drummond, olhasse com carinho, com ares de perdão, talvez pudesse encontrar algo que lembrasse a sua cidade menina-ingênua da qual tinha tanta saudade e tanto medo de rever maculada. Ela não é mais menina, nem ingênua, eu também não. Mas talvez nela ainda viva, como acontece comigo, algo que não envelhece jamais.
– out/2010
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
Tunisia
De volta da Tunisia, fico com a impressão de que visitei um mundo mágico, saído das páginas das historias de sherazade no livro das mil e uma noites. Não é propriamente bonito, é forte e comovente a luta de um povo para sobreviver.
E a beleza crua e inusitada do deserto, ou melhor, dos desertos: de dunas, de lagos salgados - onde se pode ter miragens- e oasis de palmeiras.Uma impressão ficará gravada: uma ceia em pleno deserto - cena indescritível, daquelas que precisa ver para crer...
E a beleza crua e inusitada do deserto, ou melhor, dos desertos: de dunas, de lagos salgados - onde se pode ter miragens- e oasis de palmeiras.Uma impressão ficará gravada: uma ceia em pleno deserto - cena indescritível, daquelas que precisa ver para crer...
Assinar:
Postagens (Atom)